O nosso: felizes para sempre!

Poucos dias haviam se passado desde aquela triste cena que eu havia presenciado, olhar no fundo dos olhos dele pela ultima vez, ver aquele olhar ficar cada vez mais distante, e ver, seus lindos olhos verdes se fecharem pela ultima vez foi a pior cena que eu poderia imaginar presenciar. Até agora não entendo bem o que aconteceu, em um minuto estávamos lá, sorrindo, lembrando-se dos bons momentos que passamos juntos, e de repente o choque. Um carro desgovernado o atingira em cheio e ele estava lá, estirado no chão, eu ao seu lado sem saber o que fazer, sem saber como agir. Pessoas começavam a se amontoar em volta, muitos curiosos, porém outros querendo ajudar, só conseguia ouvir as pessoas ligando para ambulâncias e para a policia, pedindo por ajuda, socorro, e mesmo com todos se mobilizando eu ainda não conseguia mover um dedo que fosse. Pouco tempo se passou e a ambulância finalmente chegou juntamente com os policiais, que chegaram perto de mim e começaram a me encher de perguntas, queriam saber ao certo o que tinha acontecido, queriam saber quem eu era, e porque eu não dizia nada. Realmente era muita informação para minha cabeça, mais aos poucos fui começando a responder as perguntas, contei com detalhes o que tinha acontecido, falava sem parar e mal respirava entre uma palavra e outra, mas quando me perguntaram novamente quem eu era e o que era dele, mil respostas me passaram pela cabeça, mas nenhuma palavra ousou sair da minha boca, sem antes ser milimetricamente pensada.  Sim, sua morte havia sido um choque pra mim e para todos os que conviviam com ele, não sei descrever com palavras como estou hoje ou como tenho lhe dado com sua morte, ele não foi só mais um em minha vida, ou só mais uma pessoa que eu conheci nesses poucos anos mal vividos, ele tinha sido O garoto, aquele que você tem plena certeza que jamais conheceria outro igual ou se quer parecido, com ele vivi os melhores dias da minha vida, com ele e por ele sorri e chorei, mas sinto que mesmo minhas lágrimas depois de todo esse tempo tinham valido a pena, afinal, a vida lhe ensinou batendo e ele havia mudado. Ele deu à cara a tapa pra vida a partir do momento em que jogou tudo para o alto. Lembro-me perfeitamente do dia em que me mudei para minha nova residência, havia acabado de completar minha faculdade de jornalismo e finalmente me sentia realizada. Não por completo, um vazio insistia em me perseguir durante anos, mas ele já se tornara de casa, muitas vezes esquecia-me dele ali e simplesmente continuava minha vida, já me tornara mestre nisso. O dia estava indo bem, tudo novo na minha casa nova, e mais uma de minhas promessas, deixar meu passado ruim para trás, queria comigo a partir daquela mudança de residência uma mudança de vida também. Completamente decidida, arrumava meu novo guarda roupa com minhas roupas quando minha campainha toca, desço as escadas rapidamente, quem poderia ser? Mal havia me mudado e já recebera visitas? Devia ser Ana Paula com mais uma de suas surpresas. Nem me preocupei em arrumar o cabelo nem minha roupa, com certeza deveria ser ela. Com a mão na maçaneta e um sorriso no rosto pronto para me jogar nos braços de minha amiga que não via já há algum tempo eu abro a porta e no mesmo instante meu sorriso se transforma em um olhar confuso, meu rosto se fecha e o coração batia acelerado depois de tanto tempo. Mal podia acreditar no que estava vendo, quem estava parado em minha porta não era minha amiga Ana Paula, e sim, o amor da minha vida, parte do meu passado ruim que eu havia prometido esquecer. Não movia um musculo se quer de todo o meu corpo. Com o olhar fixo naqueles olhos verdes que nada mudaram minha boca finalmente se mexeu: - O que você faz aqui? Como descobriu onde eu morava? Ele parecia nervoso, todo suado e tremia muito perguntou se poderia entrar e que lá dentro explicaria tudo, nos mínimos detalhes. Consenti com a cabeça e então ele entrou. Sentamo-nos no sofá na sala bem afastados um do outro, ainda em estado de choque disse: - Tudo bem, agora explique.  E de repente ele começa a falar sem parar: - Eu sei que fazem muitos anos desde á ultima vez que nos vimos, sei que muita coisa mudou e você seguiu sua vida e tudo tem dado certo pra você, mas não posso dizer o mesmo de mim. Da ultima vez que conversamos a muitos anos atrás, eu discuti com minha mãe e sai de casa, me vi vagando pelas ruas do Rio de Janeiro perdido e sem ter pra onde ir. Liguei pra um amigo meu na época, que tinha certeza que poderia confiar, ele me ofereceu sua casa como abrigo, e desde então trabalhamos juntos no negócio de sua família, mas os anos se passaram e eu já não era mais um adolescente, já tinha adquirido idade o suficiente para sair da casa de meu amigo. Consegui um emprego onde ganhava o bastante para morar em uma quitinete, e comer, nada, além disso, ao menos já não dependia de ninguém.  Há algum tempo atrás meu primo me procurou, disse que você tinha vido para cá fazer faculdade como sempre sonhou sem você saber ele me passou a faculdade em que você estava e eu fui até lá, e foi lá que descobri aonde você iria morar.  Desde nossa ultima conversa, eu não lhe tiro da cabeça, nunca colocamos um ponto final em nossa história, as coisas ficaram meio vagas, e eu estou aqui hoje, pra lhe dizer o que tenho guardado no peito a tantos e tantos anos, eu amo você, e apesar de lhe negar isso e de tentar negar a mim mesma, é algo que sempre esteve estampado em meu rosto, eu te amo. Naquele momento eu estava completamente perdida. Apesar de estar explicito em meus olhos a felicidade, duvidas rondavam minha mente, porque ele me procurara, de verdade? Porque agora e não antes? Anda, diga alguma coisa, eu dizia para mim mesma. Mas era muito complicado, era como se minha voz tivesse sido devorada pelo meu corpo, e eu só pudesse escutar o eco dela em minha mente. Mesmo querendo lhe encher com perguntas que estragariam tudo, eu não fui capaz de fazer isso, quando consegui abrir a boca, comecei a chorar, sim, chorar, chorava que nem uma criança, só conseguia chorar, e no meio das lágrimas algumas vezes alguns eu te amo escapavam tão facilmente que era incontrolável.  Quando consegui conter a emoção, conseguimos conversar, tudo o que eu tinha entalado em minha garganta mesmo depois de nossa ultima conversa, saiu de uma forma tão fácil, que só provava a ele que eu também havia mudado, não sei até hoje se fiz o certo, mas decidimos que ele iria ficar, sim, ficar ali comigo, na casa para qual eu acabara de mudar, e decidira abandonar o meu passado cruel. Engraçado, eu poderia abandonar qualquer parte do meu passado, esquecer qualquer coisa, mas esquecer dele, e de qualquer momento com ele, isso eu jamais seria capaz de fazer. Os dias iam passando, e tê-lo ao meu lado parecia um sonho, dormir e acordar com ele todos os dias, poder ouvir todas as noites antes de dormir um eu te amo meu amor, vindo daquela boca pela qual eu sempre fora encantada, acordar olhando para aqueles lindos olhos verdes que me faziam entrar em transe, nossa, isso não tinha preço. Na verdade, tudo era que nem num conto de fadas, mas tinha um detalhe importante, aquilo tudo era real. Eu não iria acordar a qualquer momento de um sonho, e nem iria ter que fechar mais um livro de romance e a história acabaria, aquilo realmente estava acontecendo. Com os dias passando, sua mudança era notável, ele nunca tinha sido tão “perfeito” comigo, os carinhos eram inacabáveis, eram abraços e beijos durante todo o dia. Ele arranjara um emprego muito melhor, e se dedicara inteiramente a isso, era linda a forma como a qual ele chegava sorridente do trabalho e dizia o quanto estava feliz em me ver. Fazíamos tudo o que eu sempre sonhei, íamos ao cinema, discutíamos pelo controle remoto, discussões que sempre terminavam na cama, ele fazia o jantar e nos divertíamos lavando a louça lembro-me bem do dia em que brigamos e saímos sem nos falar para o trabalho, eu cheguei em casa e por toda a casa tinham flores, doces, tudo o que eu mais gostava, e dois bilhetes para meu filme preferido que iria lançar no cinema, não me recordo de nenhuma outra noite tão mágica. Porém a ultima noite mágica que teríamos juntos. No outro dia acordamos cedo, havíamos combinado de sair para ir ao parque comprar um doce que só se vendia lá, e o moço que vendia ia duas vezes por mês, acordamos, nos arrumamos e fomos, chegamos lá compramos o doce e como sempre nos divertimos saboreando aquela maravilha. Já era quase hora do almoço então decidimos ir embora pelo caminho mais curto, pois a fome já estava apertando. No meio do caminho ele me perguntou se eu me lembrava de como havíamos nos conhecido? Olhei para ele com um sorriso enorme no rosto, e disse que se esquecer de um dos melhores e mais bonitos dias da minha vida seria humanamente impossível. Ele abre um sorriso de orelha a orelha, e com todas as letras diz o quanto estava feliz por estar comigo, e que queria aquilo para sempre, pois até o pra sempre seria pouco ao meu lado. Sorri e então o abracei, quando lhe soltei tudo aconteceu de uma forma tão rápida que mal pude ver, larguei de seu abraço e pude ver pela ultima vez aquele sorriso que eu tanto amava. Um carro aparecera de qualquer esquina de uma forma tão brusca e violenta em alta velocidade, e o atingira a ponto de joga-lo para longe de mim. Foi tudo tão rápido, lembro-me de ver seu corpo jogado no meio da rua, eu me lançando ao seu lado sem ter o que fazer, não estava tão perto, mas eu sentia que sua respiração estava fraca, eu via que o brilho dos seus olhos, aos poucos ia desaparecendo, e quando você virou a cabeça para o meu lado e deu o seu ultimo sorriso, eu entendi então, tudo o que tínhamos vivido nesses poucos dias que estávamos juntos, tinham valido por toda a vida que desejei ter ao seu lado. Todas as noites em que dormi e acordei ao seu lado, todos os carinhos, todas as palavras que dessa vez tinham sido sim sinceras, pude ver tudo resumido naquele ultimo olhar que me destes. Sem conseguir me mover, vi seus olhos se fecharem lentamente, ali mesmo, no meio da rua, sem que ninguém pudesse nada fazer. Você não estava em uma cama de hospital ligado a mil aparelhos que te mantinham vivo a qualquer custo, e muito menos você estava em meus braços tentando dizer suas ultimas palavras, o máximo que você conseguiu fazer foi com um único olhar, resumir tudo o que vivemos juntos, e assim me mostrar, que valeu a pena. Quando seus olhos se fecharam, só consigo me lembrar do barulho das sirenes tanto as da ambulância, quanto as dos carros de policia que chegavam sem parar. Pessoas e mais pessoas me forçando a me falar, sendo que eu mal tinha espaço para respirar. Hoje faz exato um mês que ele se foi, ter que vê-lo sendo enterrado me fez entender que a partir daquele momento, meu passado estaria sendo enterrado junto com ele, talvez aquilo fosse um sinal, de que finalmente eu poderia seguir enfrente do jeito que tinha que ser só que sem ele, afinal, já vivemos tudo o que tínhamos para viver juntos. Eu finalmente estou seguindo minha vida, conquistei o emprego de jornalista que tanto sempre sonhei na vida, e tenho tentado me focar nisso. O trabalho na redação é pesado e bem puxado, muitas vezes saio tarde e mal tenho tido tempo pra mim. Só que hoje uma surpresa muito estranha, porém boa ocorreu no trabalho, Ana Paula me ligou, disse que iria até o Rio de Janeiro para me ver, pois estaria em mais uma de suas viagens com o Arthuildo, quem nunca deixara de ser seu melhor amigo, fiquei animada, pois fazia muito tempo em que não nos víamos, ela vivia viajando e mal parava em um lugar só. Fiquei contando os dias para a chegada dos dois, tinha tanta coisa pra contar que nem sabia por onde devia começar. Porém o final de semana marcado para a visita finalmente chegou, mais ou menos no horário marcado Ana toca a campainha de minha casa, corro e dou um abraço muito forte, afinal, já não nos víamos a muito tempo, Arthuildo estava mesmo com ela, era incrível a  capacidade daqueles dois de nunca se separarem. Eles entraram e comecei a contar logo as novidades, parecia que quanto mais eu falava mais coisas surgiam para poder contar. Ana não sabia de nada, nem que ele havia voltado por um tempo, muito menos de tudo o que havíamos vivido. Nunca imaginei que fosse ver aquilo, mas enquanto eu contava lágrimas e mais lágrimas percorriam o rosto de Ana, de certa forma ela tivera razão, iriamos ser felizes por um tempo, mesmo que esse tempo não fosse todo o tempo do mundo. O tempo lá fora havia fechado agora uma chuva muito forte caia e batia na janela fazendo um barulho estrondoso. Subi para arrumar os quartos com Ana e enquanto arrumávamos ela me disse algo que permanecera em minha mente até hoje: -O amor pode sim nos surpreender, pode mudar as pessoas, e muitos acreditam que o amor mude até o mundo, o amor pode unir duas almas, dois corpos e até mesmo dois corações, talvez não em vida, mais de certa forma eternamente, mas sabe amiga, o amor sempre vai ferir alguém, sempre vai deixar marcas e cicatrizes que jamais se apagarão, porque o amor é frio, pior do que o gelo, ele pode queimar, ferir e causar um estrago incapaz de ser curado por qualquer outro, e mesmo assim insistimos no amor, porque de certa forma, alimentamos a esperança de que um seja igual ou melhor que o outro, mas esquecemos que assim como nosso coração, nosso verdadeiro amor é único, e é isso que o torna frio, sua incapacidade e seu egoísmo, de fazer com que outro, acenda uma chama maior ainda daquele verdadeiro amor. E naquela noite, aquela frase martelou em minha cabeça, e tem martelado até hoje: o amor é frio. Será que não poderia ser feliz novamente? Não, isso não era algo que eu gostaria de ter a resposta, eu já era feliz, feliz o bastante pra ter a certeza de que não importa o quão frio seja o amor, ele um dia para mim já fora a maior tocha do mundo, a maior fonte de calor que eu já tivera, e eu sei que hoje, esse calor, esse amor verdadeiro, era mais uma estrelinha brilhante, que me ilumina e me protege, mesmo que de longe, brilhando tanto lá no céu, como brilhava aqui na Terra, e sei que um dia finalmente vamos estar juntos, num lugar só nosso, sem nada e nem ninguém para nos atrapalhar, vamos poder viver então o nosso: felizes para sempre!

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