Coração selvagem.

Era madrugada, passava das 4 da manhã e John não conseguia dormir. Livvy era tudo que ele tinha de mais importante e ele a deixara escapar assim do nada. A solidão do seu apartamento minúsculo tomava conta do seu interior. Ele se levanta da cama fria e vai até o banheiro, se olha no espelho e percebe as olheiras e os olhos inchados provenientes de uma noite inteira que passara chorando. Abre o armário e pega um frasco de tranquilizantes  Era muito ansioso, fora ao médico antigamente pra tratar disso, o doutor lhe receitara um comprimido por dia, já havia tomado o correspondente àquele dia tão cruel. Por que então a dor não passara? Enquanto criava coragem foi pensando em como chegara até ali.

A primavera renascia na cidade de Nova Iorque e ninguém duvidava do quanto John era bem sucedido. Sua loja de instrumentos musicais superava todas as expectativas a cada dia. Foi quando ela surgiu. Olivia, toda pomposa, elegante, charmosa. Seu corpo esguio adentrou a loja de John e ele mesmo foi atendê-la. “O que deseja, senhorita?” Neste momento ele pode fitá-la nos olhos, de um verde tão intenso quanto o brilho de uma folha de árvore que reluzia ao sol. “Eu estou procurando um Eagle com diapasão, cabo P10, suporte, alça, enfim.” Sua voz era doce e chamou-lhe a atenção sobre seu interesse no violão. “Kit completo, então?” “Isso!” Respondeu ela com um sorriso que fez com que um tigre que havia adormecido dentro dele despertasse. Não se sentia assim fazia tempos, paixão de escola, há muito tempo atrás. Ele mostrou o violão a ela, enquanto eles conversavam sobre a aparelhagem. Ela escolheu um Eagle de madeira fosca, cuja cor lembrava a de um deck de bar. Não por coincidência, um dos favoritos dele na loja. E é claro que ele tinha um igual em casa. Mencionou isso a ela. Ela ficou encantada e ele lhe disse que ela tinha bom gosto. “Pergunta meio boba, mas... Você já toca, ou ainda vai aprender?” Ele perguntou timidamente. “Eu toco há uns 3 anos, mas ainda tenho muito que aprender.” Ele tinha que convidá-la pra sair. A oportunidade estava lançada na sua cara. “Posso te ensinar alguma coisa, tenho um estúdio que uso pra dar aulas de violão aos fins de semana e pra gravar algumas coisas também.” “Você tem um estúdio? Que demais!” “Isso é um sim?” Ela hesitou bastante, ele não era nenhum príncipe encantado, mas era de uma beleza sem igual, porém não o conhecia direito, era nova na cidade, não sabia se podia confiar num cara que acabara de conhecer. Ele percebeu e tentou de novo. “Ok, que tal um café? Podemos nos conhecer melhor.” Ela aceitou, horas depois ele se encontraram num café na esquina da mesma rua. Foi passando o tempo e pouco a pouco Olivia se encantava com o rapaz. Alguns meses depois, John estava perdidamente apaixonado por Livvy. Seu coração já não pertencia mais a ele. Entregara-o a ela. Ela, porém não o via com os mesmos olhos que ele. Discutiam várias vezes sobre esse assunto. Ela o amava, não como ele desejava, mas tinha um carinho imenso por ele através da amizade que haviam construído. O tempo foi passando e o sofrimento dele só aumentava. Ela não podia ver seu amigo sofrendo por ela. Por isso decidiu. Mal sabia ela o quanto essa decisão afetaria o emocional de John. Quando ele chegou de um dia cansativo do trabalho. Viu a secretária eletrônica apitando e clicou pra ouvir as mensagens. A primeira delas era de Livvy. “Querido John, não sei porque decidi isso, mas creio que seja o melhor pra nós dois. Posso ter sido egoísta, mas não aguentava mais ver você sofrer por mim, sabendo que eu sou a culpada por você estar desse jeito, eu não deveria ter aceitado o café. Você não merece passar por isso, você é bom demais pra mim, eu não valho nada perto de você. Por isso, esta é a última vez que você ouve a minha voz. A essa altura estarei num vôo pra São Francisco, vou trabalhar com uma produtora. Quero te agradecer, pois sem você nunca estaria onde estou. Me perdoe por estar partindo assim, mas não vi outro jeito. Adeus.” John não acreditava no que ouvia. O amor da sua vida estava indo para o outro lado do país Enquanto as lágrimas corriam, ele gritava e destruía seu apartamento. No dia seguinte não fora trabalhar. Nem no outro, nem no outro. Com o tempo a loja faliu, e ele se viu numa solidão mais que profunda e com um frasco de tranquilizantes na mão. Engoliu todos de uma vez, deitou na cama e esperou a morte chegar. Ela veio sorrateira, ele adormeceu profundamente.

O avião pousava em solo californiano, Livvy desabava em prantos escondidos por trás dos óculos escuros. A passos arrastados ela caminhava pelo saguão do aeroporto. Soubera antes de partir que aquilo era uma fuga para si própria, sabia que ele iria sofrer muito mais com a sua partida. Mas não conseguiria vê-lo definhar dia após dia por um amor que ela não sentia por ele. Chegando no hotel onde ficaria por um tempo, ela compôs uma canção que contava a história deles, na esperança de que ele, mesmo longe, pudesse ver que ela jamais se esqueceria dele. Mas era tarde demais, o coração que outrora batera por ela, agora batia descompassado e num ritmo desacelerado, até enfim cessar. Do outro lado do país, jazia um coração eternizado que não pertencia mais a ninguém. Um coração de um tigre que não rugiria jamais. 

Por: Lucas Arruda.

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