desculpa a demora, é que eu surtei.

O título não poderia ser outro, afinal, essa tem sido a frase que me acompanha a tanto tempo, ''desculpa a minha demora para responder sua mensagem, é que eu surtei'', ''desculpa a minha demora para atender, é que eu surtei'', ''desculpa a minha demora para chegar, é que eu surtei''.

Sim, eu surtei, e é tão desesperador admitir agora quanto foi na primeira vez que isso aconteceu. No começo não parece nada demais, você pensa que sozinho você consegue dar conta, você acha que aquilo não vai mais se repetir e que não precisa conversar com ninguém sobre isso.

A primeira vez você acorda assustado, pensando que aquilo era real e suando frio por ter vivido uma experiência assombrosa pela qual você nunca imaginou passar. Mas depois de um tempo você não precisa mais dormir para ''sonhar'' com as coisas, depois de um tempo seus pesadelos tornam-se parte do seu cotidiano mesmo quando seus olhos estão bem abertos.

Bom, depois de não tanto tempo assim, torna-se muito mais difícil simplesmente sair de casa, sim, pensar em colocar os pés lá fora só por lembrar da presença de tantas outras vidas ao seu redor incomoda de uma forma que jamais pensou que fosse acontecer. Aos poucos a convivência pura e simplesmente com pessoas torna-se um fardo a ser carregado, e você tão leve como uma pluma, não sustenta todo esse peso em suas costas.

Passado mais algum tempo, você nem precisa sair de casa, sua própria presença lhe incomoda, o comum lhe afinge,  o simples lhe irrita, esperar por alguns instantes para realizar tarefas simples como esperar o computador ligar, a música começar ou o cabelo secar, tornam-se longas horas exaustivas que só existem dentro de você.

E então, tudo ao seu redor te irrita, te estressa, te sufoca, e aos poucos, te mata. Pouco a pouco o seu interior vai se deteriorando como paredes antigas que tem que cair, faz parte do circulo natural das coisas, mas você não precisava se deteriorar, você não precisava ruir, e então, você desaba.

Como um prédio em ruínas que carrega uma história unica e importante que ninguém teve coragem de destruir por seu significado único uma hora cai, você também desabou, desabou dentro de si e para o resto do mundo. E aí, você não se reconhece mais, você provavelmente não vá lembrar do seu nome, de quem você é, o que você faz, e é nessa hora que você talvez não saiba, ainda, mas você não se ama mais. 

E aí meus amigos, nenhuma frase mais se encaixa tão bem na sua vida quanto ''desculpa a demora, é que eu surtei''. Sim, você surtou, eu surtei, surto todos os dias.

Surto sempre que lembro que tenho que ir a faculdade, surto por ser obrigada a ter contatos mínimos de convivência com as pessoas, surto por não ter um pingo de paciência para nada e nem ninguém, surto pelo simples fato de ter que viver, não que isso seja o suficiente para tirar de mim a minha vontade de viver, isso é outra história, mas sim, surto por isso também.

Acredite, você não está sozinho, sei que também não estou, surtar tornou-se parte do meu cotidiano assim como respirar, irônico não? Respirar apenas para mais cedo ou mais tarde, surtar. 

Pois é, então, quando eu demorar para responder sua mensagem, quando eu não atender sua ligação, quando eu me atrasar para o nosso compromisso ou quando eu sumir por algum tempo, desculpa a minha demora, é que muito provavelmente, eu surtei. 


Fotografia: Michal Macu.

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